quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Administrador sugere que ADSE pode violar Constituição

O administrador do Hospital de S. João, no Porto, questiona se a ADSE, o subsistema de saúde dos funcionários públicos, não viola a Constituição.

“Se retirar o subsídio de férias e de Natal aos funcionários públicos é inconstitucional, então usar os impostos de todos os contribuintes portugueses para sustentar um sistema que está destinado apenas a 1,3 milhões de pessoas não é também inconstitucional?”, afirma António Ferreira, em entrevista à Renascença

O administrador, que foi uma das primeiras vozes a defender publicamente a extinção da ADSE, duvida da receita proposta no memorando da “troika”, que é tornar este subsistema auto-sustentável até 2016.
Pelas contas de António Ferreira, dessa forma só seria possível manter os actuais serviços se cada funcionário público ganhasse perto de 8 mil euros por mês.

“Se for financiado exclusivamente pelos descontos dos beneficiários da ADSE, tudo bem, está perfeito. Eu desconto e tenho direito a ter cuidados de saúde até ao limite daquilo que todos beneficiários da ADSE descontam, [mas] questão não é essa. A questão é que com a despesa actual da ADSE, cada beneficiário, no activo e reformado, teria que ganhar um salário de 7.662 euros por mês, 14 vezes por ano, para que 1,5% fosse suficiente para pagar a despesa da ADSE.”

O financiamento da ADSE, sublinha, está a ser garantido não só transferências directas do Orçamento do Estado – “em 2011 foram só 30 milhões” -, mas também pelo orçamento do Serviço Nacional de Saúde, pela despesa que os hospitais públicos têm em pagar o tratamento dos beneficiários da ADSE e os seus familiares.

“O dinheiro público não pode ser destinado a manter este sistema, mas a ADSE é apenas um exemplo. Tenho os dados da ADSE, sei os valores que estão envolvidos e é um exemplo. Enforcam-me se eu disser isto, mas é igual para a ADME e para todos os outros subsistemas públicos. Há um Serviço Nacional de Saúde que é pago pelos impostos dos portugueses e que deve fornecer cuidados de saúde a todos os portugueses e tem potencial produtivo para fazer isso”, defende António Ferreira.

O administrador do Hospital de S. João, no Porto, falava à Renascença à margem da conferência do “Diário Económico” sobre financiamento da saúde.
Alternativas à extinção da ADSE
 
Outro participante no debate, o economista Pedro Pita Barros, acha que a extinção da ADSE não é a única solução possível e sugere, por exemplo, que passe a ser um seguro suplementar de saúde.


Em caso de extinção de alguns subsistemas públicos, Pita Barros defende que o dos militares deve manter-se devido às necessidades específicas destes profissionais. 

No caso da ADSE, o economista diz que, apesar de terem maior protecção na saúde, os utentes não têm melhor saúde.

Segundo Pita Barros, será agora mais difícil mudar o que poderia ter sido extinto há décadas.

eSaúde

I
Os sistemas de saúde europeus foram pensados para lidar com um modelo de tratamento intensivo, assente em intervenções cirúrgicas e cuidados de emergência, que implica internamento. Hoje em dia, porém, a maior parte dos quadros clínicos consiste em doenças degenerativas e prolongadas. O número de pessoas que sofre de uma ou várias doenças crónicas tem vindo a aumentar - tendência que deverá manter-se devido ao envelhecimento da população. As pessoas com este quadro clínico nem sempre precisam do mesmo padrão de assistência médica. Muitas preferem viver de forma autónoma em sua casa, evitando constantes  deslocações ao médico.
É, pois, fundamental adaptarmo-nos, tendo presente que a revolução digital nos pode ajudar: seja através de equipamentos de monitorização remota, que permitem avaliar e supervisionar o estado de saúde dos pacientes em sua casa e reportar os resultados ao hospital, seja através de soluções de telemedicina, que disponibilizam aconselhamento médico  especializado não presencial, ou ainda de robôs que auxiliam nas tarefas domésticas ou de simples aplicações móveis que conferem ao paciente a possibilidade de vigiar e controlar o seu estado de saúde. Não é ficção científica, as soluções já existem e muitas delas são "made in Europe". Não só garantem melhor assistência e a mais pessoas, como libertam recursos humanos nos hospitais. A longo prazo, também poderão traduzir-se em preços mais apelativos e em maior eficiência nos sistemas de saúde, assim como ajudar a construir uma indústria para o futuro.

Contudo, existe um grande fosso entre a tecnologia ‘eHealth' e os pacientes. O sector tem hesitado em aderir à revolução digital, mantendo-se fiel aos modelos e métodos tradicionais, e a classe política tem optado por não interferir num sistema que funcionou bem no passado.

O ‘eHealth' é lançado e nele se identificam diferentes formas de aplicar os benefícios digitais aos serviços de saúde para garantir melhor assistência aos nossos cidadãos. O slogan é muito simplesmente abrir  caminho à criação de serviços  de saúde mais eficientes, seguros e centrados no paciente. Para isso  é necessário dotar os pacientes  e os profissionais da Saúde de competências que lhes permitam usar as novas tecnologias, bem como incutir-lhes confiança nas mesmas. Assim como é necessário conectar equipamentos para garantir a intercomunicação e evitar repetições e desperdício, investir em investigação para aperfeiçoar a medicina personalizada do futuro, dar a conhecer e fomentar a confiança nas vantagens da ‘eHealth' para os pacientes, profissionais da Saúde e sistemas de saúde em geral, e apoiar as pequenas empresas para que estas possam fornecer as inovações de que precisamos. 
 
II

ADSE

Correia de Campos volta a surpreender numa entrevista. Depois de há poucos dias, em declarações ao Jornal de Notícias, ter afirmado, sem cedências, ser tempo de separar claramente as águas da prática pública e da privada; vem agora, por os pontos nos is sobre o maior dos subsistemas públicos:
«A ADSE é um sistema completamente irracional e, do ponto de vista social, injusto porque insere na população que são funcionários públicos ou pensionistas do Estado um dinheiro que o resto da população não tem, e paga por todos os nossos impostos. A ADSE é um sistema medíocre na qualidade porque não tem uma hierarquia de acesso. Se tiver uma doença e se for beneficiário da ADSE vai a um médico e ele tentará resolver tudo. Muito dificilmente o transfere para outro.»
Cada vez me convenço mais que, neste País, voltar-se à oposição dá clarividência. Sendo o grau de discernimento inversamente proporcional à probabilidade de se ser protagonista no acto de decidir.

Separar as águas

Em entrevista ao Jornal de Notícias, Correia de Campos aborda a governação em geral e a Saúde em particular. Pela primeira vez e de forma clara, assume haver uma reforma estrutural a fazer: concentrar os médicos e separar claramente as águas da prática pública da privada. Sem equívocos diz: Quem quiser trabalhar no público tem de estar em exclusividade. A formação, a direcção e as chefias devem ser reservadas a profissionais sem conflitos de interesses.
Eureka!. Foi preciso chegar-se a uma rotura do sistema para advogar o que Correia de Campos diz já ter sido feito há muito noutros países. Vem agora lançar o desafio de uma medida que há muito se exigia e que, contra a evidência, não aplicou ao negociar a reforma dos Cuidados de Saúde Primários.

Bem! Mais vai vale reconhecê-lo tarde que nunca. Pena é que uma medida estrutural que diz ser política e tecnicamente difícil, venha a ser proposta num momento em que o País está de pernas para o ar com o governo mais fora que dentro. Ficará, mais uma vez, para o próximo governo?